OS NOVOS
ROSTOS DA IMIGRAÇÃO PARA O BRASIL
Brasil, terra imensa, quinto maior país do mundo em
extensão territorial, com uma população de 193 milhões de habitantes. Em 1818 o Brasil adotou a sua primeira
política imigratória trazendo, primeiramente, suíços para Nova Friburgo e,
sobretudo, alemães, os quais se estabeleceram em maior número na região do Sul
do país. A partir da crise do cativeiro, foram trazidos para a lavoura,
italianos, espanhóis, portugueses, japoneses, entre outros. No pós-guerra, o
Brasil privilegiou a vinda de mão de obra especializada, em especial através
dos refugiados de guerra, pois já havia implementado seu processo de industrialização.
Entre os anos de 1950 e 1980,
a imigração para o Brasil praticamente cessou e foi a
vez da migração interna ocupar o cenário. Neste período, o Brasil deixou de ser
um país com sua população majoritariamente morando no campo para transformar-se
num país urbano, com grande concentração nas Regiões Metropolitanas.
A partir dos anos 1960, novos imigrantes começaram a
chegar: bolivianos (que já se faziam presentes nas décadas anteriores),
coreanos, e os que fugiam das ditaduras do Cone Sul – chilenos, uruguaios,
argentinos e paraguaios. Já na década de 1980, os bolivianos que chegavam
mudaram de perfil: não mais estudantes ou profissionais liberais, mas
trabalhadores braçais para o ramo das confecções. Já no final dos anos 1990,
ingressaram outros imigrantes, vindos dos países andinos (peruanos e
colombianos), mas a maior novidade foi a chegada de africanos, em especial
vindos de Angola e da República Democrática do Congo, na condição de
refugiados. Todavia, hoje o Brasil recebe, embora de maneira pulverizada,
africanos de muitos países.
Assim sendo, como indica o documento de Aparecida, há
milhões de pessoas que por diferentes motivos estão em constante mobilidade. Na
América Latina e no Caribe os emigrantes, deslocados e refugiados, sobretudo por
causas econômicas, políticas e de violência constituem fato dramático (nº 411). Desta vez, desde 2010, nesse fluxo migratório para o
Brasil temos a presença inesperada de um pequeno contingente, vindo do Caribe,
em busca de um novo recomeço.
Poucos dias após a celebração dos 206 anos da Independência
do Haiti, em 1º de janeiro, no dia 12 de janeiro de 2010,
precisamente às 16h53m, no Haiti, aconteceu uma das maiores tragédias do mundo.
Isto é, o maldito terremoto que deixou as marcas de sua raiva no país caribenho,
destruindo toda a capital e outras regiões, deixando milhões de vítimas. Foi um
ano marcado por tristezas, traumas, lágrimas, perdas de vidas e de bens
materiais. E logo em seguida, uma epidemia de cólera atingiu a população. Segundo pesquisas internacionais e
algumas especulações, essa epidemia foi trazida pelas Forças de Paz em Missão
no país caribenho, causando ainda novas vítimas. Como se não bastasse, logo em
seguida, o país se viu envolto na farsa política das fraudulentas eleições
presidenciais, mas que foi imediatamente resolvida com a ajuda da Comunidade
Internacional. Essa crise (fraude), segundo especulações, foi imposta pelo
governo para continuar no poder, e que era também a favor da permanência das
Forças Ocupantes. Diante de tudo isso, a
pergunta que se faz: O que fazer? Para
onde ir?
Após o violento e devastador sismo, muitas das vítimas
e sobreviventes, na tentativa de reescrever a gênese de um sonho, caminharam
para outras terras. Alguns para a América do Norte (Estados Unidos e Canadá),
outros para América Latina (Brasil, Equador, Argentina...) e alguns outros para
outros países.
Para o Brasil, nunca houve migração haitiana, apesar
de o Brasil ser um país com fama de acolhedor. Depois do abalo, isso não tardou
para acontecer e hoje, há migrantes haitianos no Brasil. Mas será que isso é “migração” ou apenas uma “pequena onda migratória”? Que chamemos isso
de migração ou não, ou ainda de onda migratória, em nada altera o sentido.
Falta muito ainda para que esse fluxo seja chamado “migração”, comparado com o
tamanho do Brasil. Por razões diversas, prefiro chamá-lo de: pequena onda migratória. A cada vez que
uso “onda”, refiro-me a algo pequeno ou partícula.
Essa pequena onda de migração haitiana é tema de
debate por parte das autoridades dos países para onde estão migrando, e ainda
dos meios de comunicação. Aí surge uma grande preocupação por parte das
autoridades. Em Manaus, um dos lugares em que mais cresce essa pequena onda
migratória, com a chegada desses haitianos. De fato, nem todos estão vindo
diretamente do Haiti para o Brasil. Muitos estão vindo de outros países, como
Equador, Santo Domingo, Argentina, Chile, etc., queixando-se de que a renda
desses países não lhes é favorável, é pouca. Assim, acabam saindo à procura de
outros lugares. A maioria dos que saíram do Haiti, tenta usar as fronteiras
brasileiras como lugar “de passagem ou rota” (migrantes de trânsito) a fim de
chegar a outro destino, Guiana Francesa ou outros países. Os que ficam estão
sendo acompanhados, acolhidos, orientados pastoralmente pela ação social da
Igreja-Mãe, nos lugares onde eles se encontram. Quanto a isto, o documento de
Aparecida, nos lembra: “A Igreja, como Mãe, deve se sentir como Igreja sem
fronteiras, Igreja familiar, atenta ao fenômeno crescente da mobilidade humana
em seus diversos setores. Considera indispensável o desenvolvimento de uma
mentalidade e uma espiritualidade a serviço pastoral dos irmãos em mobilidade,
estabelecendo estruturas nacionais e diocesanas apropriadas, que facilitem o
encontro do estrangeiro com a Igreja local de acolhida. As Conferências
Episcopais e as Dioceses devem assumir profeticamente esta pastoral específica
com a dinâmica de unir critérios e ações que favoreçam uma permanente atenção
também aos migrantes, que devem chegar a ser também discípulos e missionários,
o nº 412” .
À chegada desses migrantes, descobre-se que a grande maioria é evangélica.
Essa pequena onda migratória haitiana é bem recebida por
parte da população e sustentada com a solidariedade, a ação social e a caridade
da Igreja, conforme afirma o documento de Aparecida: “É expressão de caridade,
também eclesial, o acompanhamento pastoral dos migrantes” o nº411.
Do ponto de vista político, da forma que isso vem ocorrendo, percebe-se que não
houve um acordo entre os dois governos (Brasil e Haiti) dizendo: vamos receber tal quantidade de haitianos.
Na verdade, a pessoa ou o grupo que vai migrar não espera essas coisas. Sendo
assim, pode-se notar que está ocorrendo uma onda migratória de forma
desordenada. Nem mesmo responsáveis do Brasil sabem o que dizer diante disso.
Pois bem, essa pequena onda migratória haitiana para o Brasil é vista como de “migrantes ambientais ou de pessoas vítimas de desastres naturais”,
em busca de trabalho e moradia, para voltarem a sonhar, e a manter a eles
mesmos e às suas famílias. Essas vítimas são igualmente conhecidas como “desplazadas”, por razões de caráter
ambiental e/ou econômico. No total, estima-se que pelo menos 1500 vítimas
haitianas do terremoto já chegaram ao Brasil, sem contar os que estão na
fronteira com a Colômbia, em Tabatinga, à espera de documentação, para depois
alcançarem a capital amazonense, Manaus. O documento de Aparecida, bem no
final, ainda recorda que “a realidade das migrações não deve nunca ser vista só
como problema, mas também e, sobretudo, como grande recurso para o caminho da
humanidade”, o nº 413.
Essa pequena onda migratória, em nada afeta o Brasil;
pelo contrário, o favorece. O Brasil é um país em crescimento, onde a mão de
obra é necessária. A pergunta que nos fazemos é: Não seria melhor organizada
essa onda, se houvesse um acordo bilateral entre os dois países para acolher um
certo número de migrantes haitianos no Brasil?
Chegando ao final dessa pequena reflexão, como
estudante religioso, vivendo no Brasil, gostaria, enfim, de agradecer em nome
dos meus irmãos haitianos, “migrantes ambientais ou deslocados”, a todo o povo
brasileiro, sobretudo, ao povo amazonense pela acolhida dada a esses irmãos.
Por outro lado, um agradecimento que vai ainda ao Conselho Nacional de
Imigração, ao Instituto de Direito Humano, enfim, a todos os que acolheram e
continuam a acolhê-los. Torcemos para que os favoreçam com a documentação, a
fim de que se sintam livres nessa terra acolhedora, como pátria que lhes dá pão
e trabalho. Não podemos esquecer os padres e irmãs escalabrinianos, engajados
nessa missão nos vários Estados do Brasil, de maneira mais especial, em Manaus,
servindo o povo migrante, em particular, depois do terremoto, os haitianos
deslocados. Por fim, a todos os diferentes serviços pastorais e instituições da
sociedade civil; leigos e missionários que estão ajudando a esses irmãos a se
integrarem, na medida possível, na cultura e no mercado do trabalho. Que Deus abençoe esta terra amada, Brasil!
Pierre Dieucel
Estudante em teologia
Wau....Parabéns a esse Pierre Dieucel!!!
ResponderExcluirFazia tempo que não lia uma reflexão de um seminarista sobre
o tema das migrações. Esta é boa e faz sentido.
Será que estamos passando da retórica para o compromisso?
Obrigado.
Olmes
Tóquio