sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Exodo




INTRODUÇÃO
I- CONTEXTO DO LIVRO DE ỆXODO
2- ESTRUTURA DO LIVRO DE ỆXODO
II- ANÁLISE LITERÁRIA DO TEXTO
1- DELIMITAÇÃO
2- TRADUÇÃO DO TEXTO
3- ANÁLISE SEMÂNTICA
4- ESTRUTURA DO TEXTO
III- COMENTÁRIO
IV- ATUALIZAÇÃO
CONCLUSÃO
BIBLIOGRAFIA








INTRODUÇÃO


Êxodo, segundo livro dos cinco, chamado “Pentateuco”. Nesse bloco de cinco, existem narrativas que explicam as origens da humanidade e do povo hebreu, narrativas de libertação e vitórias deste povo sobre outros povos pelo poder de Deus Javé e, sobretudo, ensinos, orientações e determinações de valores para que vivessem sob a vontade do Deus Javé. Grandes exegetas afirmam que esse bloco de cinco foi escrito pelo Moisés e outros afirmam que não. De acordo com os grandes exegetas que afirmam que “sim” foi escrito pelo Moisés: Moisés o autor do Pentateuco; assim podemos ver em Moisés como a figura central do êxodo, cujo nome significa “tirado das águas”. É um livro que narra a saída dos israelitas do Egito e a sua chegada ao monte Sinai. Pela situação dos hebreus no Egito, a sua saída dali foi uma autêntica libertação e este fato se transformou no artigo fundamental do credo de Israel (cf. Dt 26, 5-26). A nossa preocupação aqui nesse trabalho não é saber quem escreveu o Pentateuco mas a partir do livro de Êxodo como uma tentativa de dar uma resposta dentro de tantas possibilidades que a Bíblia, a Palavra de Deus, pode oferecer. Tendo de tantas interpretações como realidades que vão acontecendo na história através do tempo.
Enfim, de acordo com Crusemann, a Tora o Pentateuco “trata da comunicação da vontade uma do único Deus e criador de todas as pessoas a um único povo, Israel. (...) contudo, há nela ou nele um lugar para orientações de Deus a toda a humanidade por ele criada” . Tendo essa visão, o nosso trabalho consiste em refletir sobre o livro do Êxodo.


1-CONTEXTO HISTÓRICO DO LIVRO DE EXODO
Podemos ver o livro de Êxodo como a continuação do relato do Gênesis, registra um grande desenvolvimento da figura de Moisés, a libertação de Israel do seu cativeiro, a sua caminhada do Egito até o monte Sinai para receber a lei de Deus e as instruções divinas a respeito da edificação do tabernáculo. O livro termina com a construção do tabernáculo como um lugar da habitação de Deus.
Para saber um pouco os acontecimentos históricos que constituíram a matéria-prima do testemunho desse livro, deve-se estender o olhar para além das roupagens literárias que envolvem os fatos. Então, para uma melhor compreensão, vamos tentar fazer um breve estudo do Êxodo .
Pesquisadores descobriram evidencias de influências semíticas na língua egípcia. Alguns acham que a influencia semítica foi notável na região nordeste do Delta do Nilo, onde teriam vivido os antepassados de Israel (Cf. Gn, 10; 46 28). Moisés e outras figuras desse período do Êxodo tinham nomes egípcios. Essa recíproca influência lingüística é citada como evidencia para a probabilidade histórica de que os ancestrais semíticos de Israel de fato estivessem no Egito na época do Êxodo.
Os ancestrais de Israel devem ter estado no Egito durante o reinado de Setti e Provavelmente também no tempo de Ramsés. A mais antiga referencia extra bíblica a um povo chamado “Israel” aparece numa Estela de 1220 a. C., que celebra as vitórias, na Palestina, de Merfta, sucessor de Ramsés II. Muitos pesquisadores relacionam a evidencia de que “Israel” estava na terra da Palestina pelo final do século XIII e que os hebreus (leia-se habiru) trabalhavam nos grandes projetos de construção sob Ramsés II. Concluem então que o Êxodo na região oriental no século XIII a.C, provavelmente no começo do reinado de Ramsés.
Os pesquisadores são unânimes em afirmar que houve realmente um fato em que diversos membros do povo depois conhecidos como Israel, deixaram para trás sua condição de súditos de um governo imperial opressor, no Egito, e sob liderança de Moisés, Aarão e Miriam atingiram a liberdade. Esse grupo, e talvez outros que depois se lhe juntaram, levaram para Canaã as lembranças do Êxodo, das provocações no deserto, e de um profundo encontro com o Deus YHWH.


2- ESTRUTURA DO LIVRO DE ÊXODO


O livro do Êxodo se desenvolve fundamentalmente em três cenários : Egito, o deserto e o Sinai, que dão motivo para dividir o livro em três seções:
1ª) Saída do Egito: 1, 1-15, 21;
2ª) A caminhada pelo deserto: 15, 22-18, 27;
3ª) Os acontecimentos do Sinai: 19-40


I-ANÁLISE LITERÁRIA DO TEXTO


1-DELIMITAÇÃO
Podemos perceber que o livro, segundo o autor que citamos acima, está dividido em três grandes cenários. O que nos preocupa aqui não é um estudo do Êxodo todo, é só para mostrar onde queremos chegar. Além disso, podemos perceber também que não fizemos esboço de cada parte. Entre essas três partes dos cenários, vai ser trabalhado o terceiro cenário.
O terceiro cenário é a seção do Ex 19-40. É a mais heterogênea e complexa, tanto no aspecto formal (combinação de narrativas e leis) como na temática (teofania, aliança, decálogo, código legal, santuário, bezerro de ouro). O único que não muda é o cenário, o monte do Sinai. Enfim, é dentro desse cenário que vai ser trabalhada a nossa perícope: Ex 23, 10-12. Eis aqui a nossa delimitação e a nossa perícope.


2-TRADUÇÃO DO TEXTO


10. w> Partícula conjunção E
vveîw Adjetivo feminino singular absoluto, homônimo 1 Seis
~ynIßv' Substantivo comum feminino plural absoluto Ano
[r:äz>Ti Verbo qal imperfeito 2ª pessoa masculino singular Sembrar
-ta, Partícula objeto direto ((...) Com, Junto a, ao lado de
^c<+r>a;- Substantivo comum feminino singular construto sufixo 2ª pessoa masculino singular Terra
w> Partícula conjunção E
Þp.s;a Verbo qal vav perfeito, 2ª pessoa masculino singular Recolher
-ta, Partícula objeto direto (...)
Ht'(a'WbT. Substantivo comum feminino singular construto sufixo 3ª pessoa feminino singular Produto, renda
11. w> Partícula conjunção E
h; Artigo O
t[iúybiV Adjetivo feminino singular absoluto Sétimo
hN"j<åm.v.Ti Verbo qal imperfeito 2ª pessoamasculino singular sufixo 3ª pessoa feminino singular Deixar solto, largar
W Partícula conjunção E
HT'ªv.j;n Verbo qal Val perfeito 2ª pessoa masculino singular sufixo 3ª pessoa feminino singular Deixar
w> Partícula conjunção E
Wlk.a Verbo qal Val perfeito 3ª pessoa plural Comer, consumir
ynEåyOb.a, Substantivo masculino plural construto Pobres, necessitados
^M,ê[; Substantivo comum masculino singular construto sufixo 2ª pessoa masculino singular Povo, nação, tribo
w> Partícula conjunção E
~r"§t.y Substantivo masculino singular construto sufixo 3ª pessoa masculino plural Resto
lk;ÞaTo Verbo qal imperfeito 3ª feminino singular Comer, consumir
tY:åx; Substantivo comum feminino singular construto Animal, bichos, vida
h; Partícula artigo A
hd<_F' Substantivo masculino singular absoluto Terra, campo
-!KE Partícula advérbio Justamente, certamente, assim, da mesma forma, reto
hf,î[]T Verbo qal imperfeito 2ª masculino singular Fazer
l. Partícula preposição Para, a
^ßm.r>k; Substantivo comum masculino singular construto sufixo 2ª pessoa masculino singular Vinhedo


l. Partícula preposição Para, a
^t<)yzE Substantivo masculino singular construto sufixo 2ª masculino singular Oliveira, oliva
12. tv,veÛ Adjetivo masculino singular construto Sexto
~ymiy" Substantivo comum masculino plural absoluto Dias
hf,ä[]T; Verbo qal imperfeito 2ª pessoa masculino singular Fazer
^yf,ê[]m; Substantivo masculino plural construto sufixo 2ª masculino singular Trabalhos
W Partícula conjunção E
b; Partícula preposição Em, por, com
h; Partícula artigo A


~AY Substantivo comum masculino singular absoluto Dia
h; Partícula artigo O
y[iÞybiV. Adjetivo masculino singular absoluto Sétimo
tBo+v.Ti Verbo qal imperfeito 2ª pessoa masculino singular Observar, deixar de
![;m;äl. Partícula preposição Afim de que, para que
x:Wn©y" Verbo qal imperfeito 3ª pessoa masculino singular Descansar
^r>Av* Substantivo masculino singular construto sufixo 2ª pessoa masculino singular Boi
w: Partícula conjunção E
^r<êmox: Substantivo masculino singular 2ª construto sufixo 2ª masculino singular Jumento
w> Partícula conjunção E
vpeîN"yI Verbo nifal imperfeito 3ª masculino singular Tomar refresco, alívio
!B, Substantivo masculino singular construto Filho
ßt.m'a Substantivo feminino singular construto sufixo 2ª masculino singular Servente, serva
w> Partícula conjunção E


h; Partícula artigo O
rGE) Substantivo masculino singular absoluto Estrangeiro (residir temporalmente)






`Ht'(a'WbT.-ta, T'Þp.s;a'w> ^c<+r>a;-ta, [r:äz>Ti ~ynIßv' vveîw> 10
~r"§t.yIw> ^M,ê[; ynEåyOb.a, ‘Wlk.a'(w> HT'ªv.j;n>W hN"j<åm.v.Ti t[iúybiV.h;w> 11
`^t<)yzEl. ^ßm.r>k;l. hf,î[]T;-!KE) hd<_F'h; tY:åx; lk;ÞaTo
![;m;äl. tBo+v.Ti y[iÞybiV.h; ~AYðb;W ^yf,ê[]m; hf,ä[]T; ‘~ymiy" tv,veÛ 12
`rGE)h;w> ^ßt.m'a]-!B, vpeîN"yIw> ^r<êmox]w: ‘^r>Av* x:Wn©y"


10- Seis anos tu semearás a tua terra e recolherás os seus frutos
11- E no sétimo ano, tu a deixarás solta (descansar) e não a cultivarás para que os pobres do teu povo achem o que comer e que comam os animais do campo. Assim tu farás com a tua vinha e com a tua oliva.
12-No sexto dia tu farás os teus trabalhos e no sétimo tu descansarás para que descanse o teu boi e o teu jumento; e tome alívio o filho da tua serva e o estrangeiro.
A nossa tentativa para a tradução do texto hebraico poderia ser apresentada de forma seguinte:
Seis anos tu semearás a tua terra e recolherás os seus frutos. E no sétimo ano, tu a deixarás solta (descansar) e não a cultivarás para que os pobres do teu povo achem o que comer e que comam os animais do campo. Assim tu farás com a tua vinha e com a tua oliva. No sexto dia tu farás os teus trabalhos e no sétimo tu descansarás para que descansem o teu boi e o teu jumento; e tome alívio o filho da tua serva e o estrangeiro.


3-ESTRUTURA DO TEXTO, Ex 23, 10-12
Neste pequeno panorama de nossa tradução, podemos perceber como Javé faz um convite ao povo a respeito da terra pelo seu bom uso, pelo descanso e também para que os pobres e os animais achem o que comer. A nossa pequena estrutura pode ser dividida em três partes. Mas antes de tudo no conjunto do texto, se trata do ano sabático e do sábado. O primeiro e o segundo versículo (10-11) é dar descanso à terra cada sete anos. No versículo 12, é o descanso no sétimo dia. Assim nós temos:
A-10. Semear e recolher
B-11. Dar descanso à terra durante sete anos
C-12. Descanso no sétimo dia


3-ANÁLISE SEMANTICA


Três palavras do texto vão ser analisadas: Sábado (descansar x:Wn©y"), pobre (pobreza) ynEåyOb.a, e estrangeiro rGE) .
Sábado do hebraico “shabbat” t[iúybiV. É o sétimo dia da semana no calendário israelita marcado pela observância religiosa, e mais provavelmente por alguma outra espécie de observância cultural. Há testemunhos do sábado que, de acordo com a crítica aceita geralmente, remontam ao período da monarquia: além desse período, é difícil poder afirmar alguma coisa com certeza. O nome shabbat está ligado à raiz SHBT, que significa repousar ou cessar; o “repouso” pode ter diferentes conotações nos diferentes contextos. Durante a monarquia, o sábado é atestado em apenas algumas passagens. Era um dia em que o comércio era proibido (AM 8, 5). Era um dia em que se podia esperar visitar o “ homem de Deus”, o profeta (2Rs 4, 23). Era um dia de descanso do trabalho, para animais e escravos, não menos do que para os israelitas (Ex 23, 12; 34, 12).
Deduz-se de 2 Rs 11, 5-9, que o número de homens postados na guarda do palácio era reduzido a metade no sábado. Era um dia de descanso para os israelitas, os seus animais e os seus escravos, porque os israelitas, eles mesmos uma vez escravos no Egito, deviam ter compaixão daqueles que eram forçados a trabalhar ( Dt 5, 12-15). Observa-se o sábado santificando-o (Ex 28, 8-10; 31-16; Is 56, 2.6); violar o sábado é “profanar” a sua santidade (Ne 13, 15-22; Is 56, 2.6; Ez 20, 16-26; 22, 8.26). O sábado é profanado pelo exercício do comercio, e Neemias fechava os portões de Jerusalém no sábado para impedir o comércio (Ne 13, 15-22). Outro midraxe em Ex 16, 22-30 conta como o próprio Iahweh observou o sábado não dando o maná, e isso compeliu os israelitas a guardarem o sábado não recolhendo o maná. O significado do descanso sabático é muito ambíguo. Então “descanso” pode significar repouso ou simples cessação do trabalho. O Dt propõe o descanso sabático como repouso humanitário. A observância sacerdotal sucessiva não é tão claramente humanitária. O sábado era um dia santificado a Iahweh; assim como as pessoas e coisas podiam ser consagradas e assim subtraídas ao uso profano. O trabalho era um elemento secular que profanava o sagrado; o fato de a cessação do trabalho envolver repouso era meramente incidental. Essa concepção acerca do descanso sabático chegou a obsessão no judaísmo tardio foi criticado por Jesus.. A penas Mc 2, 27 conservou o dito segundo o qual o sábado foi feito para o homem, não o homem para o sábado, que sumaria o ensinamento de Jesus melhor do que qualquer outra frase.
No AT há diversos termos hebraicos para expressar pobreza, mas nenhum deles pode ser traduzido exatamente por “pobre”. ‘anî literalmente “aflito”; no uso, a aflição consiste em ser membro de uma classe mais baixa, indigente e sujeita à opressão, sem meios para se defender. A forma aramaizada correspondente, ‘anaw é sinônima, mas é freqüentemente usada acerca dos pobres em sentido religioso. No ano sabático, os campos devem deixados em alqueive, para que os pobres possam comer aquilo que cresce ali (Ex 23, 10-11). Em salmo 69, 33, o pralelismo dos versos torna o pobre sinônimo daqueles que procuram Deus. O que o pobre podia legitimamente esperar era que o rico não tirasse vantagem dele, particularmente usando sua riqueza para corromper a administração do governo e dos processos judiciários. No mundo grego, ao contrário, parece ter demonstrado muito pouca humanidade para com os pobres. Os pobres eram considerados como não desfrutando de nenhuma proteção divina especial. Dar esmola ao pobre é a boa ação que deve ser feita mais por nobreza de animo do que por exigência moral e as cidades gregas, tão avançados em outras instituições, não demonstram nenhum cuidado público pelos pobres. Os pobres, caso perdessem toda a sua renda, podiam sempre vender a si mesmo e suas famílias como escravos.
rGE) Estrangeiro na Bíblia designa alguém que não é membro do grupo social. Na sociedade primitiva israelita primitiva, que era patriarcal, o estrangeiro era uma pessoa que não era membro da tribo. Com o estabelecimento no país e o surgimento da monarquia, o estrangeiro chegou a significar não israelita, quase equivalente ao nosso “não nativo”. O estrangeiro podia mora em Israel, seja como hóspede (ger ou tôshad). Nenhuma distinção pode ser indicada entre ger e toshad, e é provável que os dois termos venham de fontes e tradições diferentes. Alguns críticos opinam que toshab, “habitante” é um termo mais tardio. Ger é freqüentemente traduzido em versões mais antigas por “imigrante”. A posição do ger pode-se observar nas narrativas; Abraão era ger no Egito e em Canaã (Gn 12, 10; 17, 8; 20, 1; 21, 34; 23, 4). R. de Vaux, acredita que no no período mais antigo, o ger não podia ser proprietário de terras, mas que se sustentava pelo seu trabalho assalariado (Dt 24, 14).
Concluindo essa parte do nosso trabalho, podemos perceber como que Israel nasceu como um povo pobre, ligado à condição de estrangeiro, de escravo e de leis; daí essa experiência deve ter marcado a sua vida histórico-religiosa, mas também a sua visão de Deus. Este povo nasceu pobre, viveu pobre e era um povo pobre, que tem como Deus o Deus dos pobres. Toda a epopéia do Êxodo torna-se um acontecimento exemplar, revelando um Deus que não permite que nenhum homem, mulher ou povo viva na miséria, em condições desumanas, na pobreza ou em qualquer tipo de opressão.


II- COMENTÁRIO DO TEXTO, Ex.23, 10-12
O conjunto do texto nos parece muito bem claro de que se trata do ano sabático e o sábado; pobres, terra e animais. Agora, a pergunta que poderíamos nos fazer: o que isto nos diz para nossa realidade?
Ao longo do nosso trabalho, vamos tentar dar uma resposta a partir de alguns teólogos biblistas , sobretudo, Reimer.
É a partir do texto de Levítico 25 com sua concepção do ano jubilar, que se fala de um conjunto de tradições jubilares na Bíblia. São os textos que falam que se deve trabalhar seis dias e descansar um dia. Seis anos de trabalho ou servidão devem ser seguidos por um ano de libertação ou descanso. O shabat (o dia de descanso) é uma das bases do jubileu. Este dia tem como noção fundamental o tempo de descanso, um tempo para não fazer nada, em meio aos trabalhos do cotidiano. “Disso falam as tradições cronologicamente mais antigas acerca do sábado (Ex 34,21; Ex 23,12; Ex 20,8-11; Dt 5,12-15)”. Outros textos afirmam que o sábado deve ser celebrado como culto a Deus. Este mandamento não pode ser violado através de trabalho “(...) (Ex 31,13-18; 35,2-3; Lv 19,3.30; 23,3). Na Bíblia encontramos a tradição do chamado ano sabático. Esta propõe um ritmo de seis anos de trabalho seguidos de um sétimo ano de descanso. Reimer afirma que não se sabe ao certo a origem desta tradição. Acredita-se que ela seja antiga, ligada com práticas de descanso e rodízio no cultivo da terra. Nas culturas vizinhas de Israel esta prática era conhecida. Por exemplo: “Entre os cananeus o descanso da terra poderia estar relacionado com ritos de fertilidade, que tinham o propósito de garantir a fertilidade da terra e de apaziguar os deuses. Na tradição de Israel, a motivação para essa prática é o dado de que Deus-Javé é celebrado como o senhor de toda a terra. ‘Ao Senhor pertence a terra...’ (Sl 24,1)”.Reimer considera que a tradição do ano sabático é uma aplicação dos dias da semana a uma seqüência de anos. O autor acredita que esta tradição está vinculada com três variantes do tema: o descanso da terra no sétimo ano (Ex 23, 10-11), a libertação de escravos e escravas (Ex 21,2-11; Dt 15,12-18) e o perdão de dívidas ao final de cada sete anos (Dt 15,1-11).2.5.2. Descanso sabático da terra (Ex 23,10-11): terra, pobres e animais. A lei do descanso da terra é, nos dizeres de Reimer, a expressão mais antiga da tradição do ano sabático (Ex 23,1-11). Este texto encontra-se no conjunto do código da aliança (Ex 20,22 - 23,19), que é considerado, pelo Antigo Testamento, como um dos primeiros conjuntos de leis “revelados” por Deus a Moisés no Sinai. Reimer considera que a primeira fase (1250-1000 a.C.) da história do povo de Israel é característica de uma sociedade agrícola, com fortes traços de um igualitarismo social, em contrapartida ao “feudalismo” cananeu com sua sociedade tributária. Essa tendência igualitária do Israel pré-estatal começou a ser rompida com o uso do boi na agricultura. Reimer afirma que este avanço tecnológico ocorreu em torno do ano 1000 a.C., na mesma época da instituição da monarquia de Saul (1Sm8-16) e depois da monarquia de Davi (1Sm 16 – 1Rs 2) e Salomão (1Rs 3-11). De acordo com o autor, podemos perceber o uso de boi na agricultura. Essa nova tecnologia permitiu a acumulação de riqueza por parte de famílias e clãs que tinham este recurso. Esses grupos familiares prosperavam mais, já que não dependiam somente da mão-de-obra humana familiar e escrava. Para Reimer, o uso do boi na agricultura foi responsável por uma infinidade de conflitos no antigo Israel. Segundo Reimer, o código da aliança (Ex 20,22 - 23,19) além de buscar mediar conflitos, resguardar não poucas vezes o interesse do lado mais forte, também contem várias leis de caráter ético-humanitário. Estas leis protegem os direitos dos fracos, especialmente os estrangeiros (Ex 22,21; 23,9), os órfãos e as viúvas (Is 10, 1-3). A terra está incluída entre estes elos mais fracos, recebe uma legislação específica vinculada com o direito dos pobres e dos animais. Êxodo 23, 10-11.
É possível perceber essa evidência nas expressões: “semear a terra” e “recolher os frutos”. O autor diz que estas são expressões que indicam para a prática do cultivo e da cultura, sendo isso ressaltado na lei como um ‘direito humano’ plenamente concedido por Deus. A lei, porém, afirma que após um período de seis anos de trabalho, o sétimo ano deverá ser um ano de descanso para a terra. A terra recebe o direito de repousar. “O que usualmente se traduz por ‘descansar’ é expresso no original hebraico com o verbo shamat, que tem o significado de ‘largar mão’, ‘deixar livre’”. O texto legislativo de Êxodo 23,10-11, para Reimer, evidência um pensamento teológico com perspectiva ecológica. A terra tem direito de descansar. Existe aqui uma consciência pré-moderna de que a terra é parte integrante da criação de Deus. A terra não é pensada de forma cartesiana, somente como uma realidade existente em função dos seres humanos, e estes não são concebidos acima da terra. A terra possui seus direitos específicos.
A lei do ano sabático da terra vai além do direito de descanso da terra. Atinge também o povo pobre. Não cultivar a terra no sétimo ano deverá permitir também que os pobres possam ter o que comer. “Muito provavelmente trata-se aí do ‘direito de respigar’, uma tradição supostamente antiga, mencionada em Rute 2, 1-7 e Deuteronômio 24, 19-21” Os animais do campo também são beneficiados pela lei. “A analogia entre o sábado do homem e o sábado da terra significaria que a terra deve ‘descansar’ para se renovar e recuperar seu vigor produtivo. Ou seja, os recursos da terra devem ser considerados, evitando-se um uso desmedido. A Bíblia, como se vê, liga essa recomendação à justiça social. Não se deve explorar abusivamente a terra, para que todos comam, inclusive os animais. Talvez o ano sabático seja a expressão da consciência daquilo que hoje chamamos de equilíbrio ecológico” . O descanso da terra no sétimo ano provavelmente, nos dizeres de Reimer, deve ter feito referência a todo tipo de produção do campo, especialmente as plantações de cereais, que são cultivadas anualmente. A formulação da lei em Êxodo 23, 11, no entanto, menciona especificamente também a vinha e o olival. Estes eram os produtos “nobres” da agricultura daquela época. “Em Amós 5,11, por exemplo, estes produtos são considerados como as plantações dos israelitas ricos”.
Reimer faz uma observação importante: A lei do descanso da terra não é retomada no “código deuteronômico” (Dt 12-26). Este é, segundo o autor, em seguimento a Crüsemann , uma reedição revista e atualizada de leis mais antigas, na segunda metade do século VII a.C. Para Reimer a lei é modificada em dois sentidos: Primeiramente, percebe-se que ao invés de um descanso da terra no sétimo ano, o Deuteronômio introduz a lei do ano da remissão de dívidas (Dt 15,1-11). Proporciona isso, provavelmente, um prejuízo menor para os produtores. Segundo, o Deuteronômio cancela o ano sabático da terra, mas assegura aos pobres o direito de respigar em todas as culturas agrícolas, recolhendo as sobras após a colheita principal de cada ano (Dt 24, 19-21). A tradição de um ano sabático da terra, segundo Reimer, é novamente
retomada no contexto de um conjunto legislativo da época do exílio e do pós-exílio, chamado “código da santidade” (Lv 17-26). No texto de Levítico 25, que trata da santificação de tempos especiais, afirma-se novamente o direito da terra de obter um descanso no sétimo ano. É interessante observar algumas referências sobre a prática da lei do descanso da terra no sétimo ano do povo do antigo Israel. Reimer destaca que em Neemias 10, um texto do século V a.C., relata-se de uma cerimônia de renovação de aliança. Nesta cerimônia pública, o povo hebreu deveria se comprometer a observar um conjunto de preceitos. Dentre estes, fala-se no v. 31 da prática da observância do sábado e de que no sétimo ano se deveria abrir mão da colheita e de toda e qualquer cobrança.


III- ATUALIZAÇÃO
Atualizando essa perícope, hoje esses fatos estão repetidos como marca de injustiça de várias formas em todos os cantos do mundo. A primeira coisa que podemos perceber é a luta pela terra, invasão na terra territorial, as pessoas sem terra. A respeito disso, em 1980 os Bispos da Igreja Católica lançaram um documento em sua XVIII assembléia, “Igreja e problemas da terra”. Diz que “o desejo incontrolado de lucros leva a concentrar os bens produzidos com o trabalho de todos nas mãos de pouca gente. Concentram-se os bens, o capital, a propriedade da terra e seus recursos, concentrando-se ainda mais o poder político, num processo cumulativo resultante da exploração do trabalho e da marginalização social e política da maior parte de nosso povo” . E falam acerca dos conflitos entre, de um lado, grandes empresas, grileiro e fazendeiros e, de outro, posseiros e índios. Violência de toda ordem que envolve jagunços, pistoleiros profissionais, forças policiais, oficiais de justiça e até mesmo juízes. A extrema violência da luta pela terra se mostra se mostra com características de uma guerra de extermínio .
Como dizem sempre “o individuo não deve viver para trabalhar, mas sim trabalhar para viver”. O grande São Paulo apóstolo: quem não trabalha não come. O que tem atrás disso? Isso é para ver como é importante trabalhar; mas também a terra precisa descansar do mesmo jeito que o trabalhador descansa do esforço laboral despendido durante a semana, preservando a sua saúde. Não sempre foi assim. Num artigo de Schmidt , nos conta que quando ocorreu na Inglaterra a denominada “Revolução Industrial” no século XVIII, os empregados eram obrigado a laborar em condições sub-humanas, em ambientes mal-iluminados, abafados, sujos, recebendo salários baixinhos por jornadas de trabalho que chegavam até a 18 horas por dia, sem intervalo, nem dias de folga, feriados; chegando-se ao cúmulo de se sujeitarem a castigo físico de seus Patrões. Esse mesmo artigo fala a visita de um grande naturalista Francês chamado Saint-Hilaire, no Brasil. Visitou regiões tais como: Santa Catarina, Minas Gerais, Rio grande do Sul, Rio de Janeiro Espírito Santo; observando a desordem nas plantações por parte dos lavradores e a necessidade do descanso da terra para melhor produzir. Por exemplo, ele verificou no Rio Grande do Sul que as terras de mata admitiam, três anos consecutivos de plantação, sendo que depois era preciso deixar outros três anos em descanso. Outra grande observação, disse ele: “ quando a cana de açúcar começa a não mais produzir, é substituída pela mandioca, que então recompensa amplamente o trabalho do agricultor, e quando essa raiz já não produz bem, volta-se ao plantio da cana, cujos colmos vegetam então com todo vigor”. Isso quer dizer, a cana deve ter três cores, afina, depois de ter a terra assim produzida, sem adubo algum, durante nove anos consecutivos, era deixada em descanso durante cinco anos. Passado esse período reiniciavam as plantações novamente.
Podemos perceber isso na experiência do povo hebreu, a cada seis anos de trabalho na terra, se deveria deixá-la descansar o sétimo. Esse sétimo ano foi chamado de ano sabático, em referência ao sétimo dia da criação, o sábado. Esse ano de descanso para a terra (ano sabático ou jubilar) punha um limite na ganância de produzir para acumular e visava preservá-la. O significado para o nosso hoje é muito diferente e muito óbvio. Isso quer dizer para nós é preciso que haja um limite na exploração que o homem faz das riquezas naturais do planeta. Isso é muito bem claro no corte da cana açúcar. É uma verdadeira exploração aos nossos irmãos migrantes. A grande pergunta, como já nos explicou o naturalista Francês, será que eles deixam descansar aquelas terras? Vivemos numa sociedade de desigualdade social, poucos têm muito e muitos têm pouco, sempre uns tiram proveito dos outros, se apropriando inclusive de sua existência como no trabalho escravo. Aquilo que faze parte do bem comum é freqüentemente apropriado por alguns poucos. Não podemos esquecer também a história da América Latina e do Caribe está marcada por lutas constantes de libertação desde o tempo dos colonizadores do século XVI pelos espanhóis, os portugueses, os franceses e os ingleses. Até nos dias de hoje a maioria desses países está dominada pelo neoliberalismo.
Depois de ter elaborado essa reflexão do livro de Êxodo 23, 10-12, como que podemos concluir?


Ao longo da nossa reflexão, podemos perceber os grandes temas que foram desenvolvidos. Tais como: o sábado, o ano sabático, o descanso tanto a terra como o ser humano. Não é só no Êxodo que aparece a questão de “terra”. O Antigo Testamento todo trata a questão de “terra”. Livros tais como para citar uns exemplos: Neemias, Esdras, Amós, Levítico, Josias, Sofonias (profeta menor) etc. Podemos dizer que a questão da terra nós aparece no Êxodo, como já dissemos encima: o indivíduo “não deve viver para trabalhar, mas sim trabalhar para viver”. E também como o Êxodo é um livro que trata o tema “libertação (a saída)”, de igual jeito a terra precisa “libertação. Essa libertação é deixá-la descansar. Refletindo sobre o nosso trabalho, talvez para remediar aquela situação, o ano jubilar tinha um significado libertador: numa sociedade em que uma dívida poderia reduzir seu devedor à escravidão, o ano sabático indicava a libertação: “quando comprares um servo hebreu, ele te servirá durante seis anos, no sétimo readquirirá a liberdade, sem nada pagar” (Ex 21, 2). E não deverá ser posto em liberdade de mãos vazias:” no sétimo ano, tu o deixarás ir em liberdade. Contudo, quando tu o deixares ir em liberdade, não o despeças de mãos vazias: carregue os ombros dele com o produto do teu rebanho, da tua colheita de cereais e uva. Dê lhe de acordo com a benção que Javé seu Deus tiver te concebido “(Dt 15, 12-14). Em levítico capítulo 25 também nos fala do ano jubilar. Não bastava o sábado para o descanso dos homens, o ano sabático para o descanso da terra e para o perdão das dívidas. Era preciso uma lei que proibisse também a concentração de bens. Para isso se instaura o qüinquagésimo ano, ou seja, depois de aproveitar dos bens por 49 anos, estes deveriam retornar aos donos de origem (Lv 25, 10-12). A razão para que a terra não possa ser comercializada. Definitivamente está em sua pertença a Deus. Será que hoje é assim? Mais para frente diz no mesmo livro Lv 25, 23-24: “a terra não poderá ser vendida para sempre, porque a terra me pertence, e sois para mim imigrantes e hóspedes; por isso, em qualquer terra que possuíres, conceda o direito de resgate”.




BIBLIOGRAFIA


- ALFONS Deissler, o anúncio do Antigo Testamento, Edições Paulinas, São Paulo, 1984


- ETIENNE Charpentier, pour lire l´ancien Testament, Édition Du Cerf, Paris, 1980


- GARCIA LÓPEZ Feliz, o Pentateuco, Editora, Ave-Maria, São Paulo, 2004.




- MCKENZIE John. Dicionário Bíblico. Paulinas, São Paulo, 1983.




- SCHWANTES, Milton. Anotações sobre novos começos na leitura bíblica. Releituras bíblicas dos anos cinqüenta, sessenta e setenta na América Latina. In: REIMER, Haroldo; SILVA, Valmor da (Orgs.). Hermenêuticas Bíblicas: Contribuições ao I Congresso Brasileiro de Pesquisa Bíblica. São Leopoldo: Oikos; Goiânia: Ed. da UCG, 2006. P.11-32.


- SMITH, Marks. O memorial de Deus. História, memória e a experiência do divino no Antigo Testamento. Paulus, São Paulo, 2006.

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